sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Começou a época

Cogumelos Silvestres na região do Douro
Uma riqueza que é urgente preservar e valorizar



Na área dos Parques Naturais do Douro Internacional e Arribes del Duero os cogumelos silvestres existem em diversidade e abundância, tendo alguns deles grande interesse gastronómico e comercial. Míscaros, roques, sanchas, orelhas de gato, pantorras e boletos, os nomes vulgares pelos quais são conhecidos, parecem ser os mais comuns e mais apreciados, para além dos famosos ovos de rei, mais raros, pagos ao apanhador a mais de 50 euros por quilo, e de muitos outros.Um indicador do interesse desta actividade foi a criação, há cerca de sete anos, da Associação Micológica A Pantorra, sintomaticamente sediada em Mogadouro, cujo fim é promover o conhecimento científico, técnico e gastronómico dos cogumelos. Esta Associação está a realizar o inventário das espécies regionais e promoveu já seis Encontros Micológicos Transmontanos, o V Congresso Luso-Galaico de Macromicologia, e cursos de Introdução à Micologia, em colaboração com a UTAD. Associação congénere, igualmente activa, está sediada em Zamora, a Associação Micológica Zamorana.Segundo o presidente da A. M. a Pantorra, Francisco Xavier Martins, em Trás-os-Montes os míscaros e outros cogumelos eram o pão da terra, comida dos pobres e, apesar das intoxicações, os cogumelos continuaram a ser consumidos. Este mesmo autor associa o desenvolvimento da produção à florestação da década de 70 do século passado, com a qual espécies como a cerejeira, o carvalho americano, o freixo, o castanheiro, o sobreiro, o pinheiro, a pseudotsuga, o cupressos e a nogueira se espalharam pelo território transmontano, algumas das quais importantes para a formação de cogumelos. Actualmente a colheita incide num número restrito de espécies, de forma muito intensiva e sem qualquer tipo de regulamentação e controle das quantidades transaccionadas, embora exista a percepção de elevados montantes envolvidos. Na região não existe ainda nenhuma empresa de comercialização e transformação, encontrando-se no Sátão (Viseu) a empresa portuguesa mais próxima. Em Mogadouro, alguns restaurantes servem hoje pratos de cogumelos silvestres, razão pela qual têm vindo a ser procurados. O maior rendimento é para meia dúzia de colectores e intermediários que vêm em carrinhas e os recolhem nas aldeias, normalmente pagando muito pouco face ao valor do produto no mercado.
No passado, o conhecimento e uso deste recurso estava muito ligado aos habitantes das aldeias, ao território, sua cultura e à pequena economia doméstica. Hoje temos os apanhadores que vêm de fora, empresas de comércio ou transformação, interesses diversos que se movem. Em artigo da Grande Reportagem de 30 de Outubro de 2004 dizia-se: Os cogumelos silvestres já não são apenas um recurso silvícola que nasce espontaneamente, um bem para a população de uma dada região, pois as províncias de Trás-os-Montes, Beiras e Alto Alentejo, nomeadamente nas zonas da raia, são invadidas por uma praga de apanhadores que, sobretudo ao fim de semana, chega de vários pontos do país e calcorreia a terra, sem respeito pela propriedade alheia e sem olhar a meios para atingir os fins. A única preocupação dos colectores é o peso da colheita: quanto mais pesada melhor!.A situação actual, do lado de Trás-os-Montes e Douro é preocupante, face à apanha indiscriminada e sem controlo, geradora de riscos para sobrevivência das espécies mais procuradas e ameaçadora da própria economia (tendencialmente frágil) dos agregados que se dedicam a esta actividade. O depoimento de mulheres colectoras da Beira Baixa, no já citado artigo da Grande Reportagem, indica que as quantidades são cada vez menores. No entanto, segundo a Profa. Guilhermina Marques, da UTAD, a produtividade é muito variável e depende muito das condições climáticas. Por exemplo, há dois anos foi um ano excelente para a espécie Amanita ceasarea, que é a espécie de maior valor económico em Trás-os-Montes. As pessoas têm sentido a diminuição principalmente porque há mais gente a colher e apanham logo que aparecem, sem os deixar desenvolver. Não há regras de colecta e apanha-se à toa.
Do lado do Duero a situação parece claramente diferente, com uma melhor organização da fileira e um esforço para normalizar a recolha, sendo um facto que muitas regiões de Espanha têm já regulamentação para a colheita e comercialização de cogumelos. A título de exemplo, a ADATA, Associação para o Desenvolvimento de Aliste, Tábara e Alba, produziu um pequeno guia ilustrado com conselhos e normas para a recolecção e consumo de cogumelos, tendo para tal o apoio do Ministério da Agricultura e da Junta de Castela e Leão, e o enquadramento científico do IRMA, Instituto de Restauração e Meio Ambiente. Este mesmo Instituto produziu uma obra didática sobre cogumelos silvestres, com o suporte de uma vasta equipa científica, que nos foi mostrado por uma trabalhadora portuguesa de uma das fábricas dos arredores de Alcañices. A principal diferença está no melhor aproveitamento, maior valorização, regulamentação e organização, beneficiando ainda (os comerciantes espanhóis) da falta de organização que existe do lado português, que lhes permite adquirir os cogumelos a preços mais baixos e segundo regras que conduzem a uma subvalorização do produto.A valorização dos cogumelos silvestres, transformando-os no recurso efectivo de desenvolvimento local do Douro-Duero é uma exigência. Para tal é essencial: (1) conhecer melhor este recurso, através da investigação, dos inventários, mapeamentos, estudos sobre as características, produtividades, qualidades e os usos dos cogumelos; (2) estabelecer e fazer cumprir regras claras de gestão e uso integrado e sustentável; (3) realizar acções de educação ambiental, geradoras de mais conhecimento e consciência sobre a importância deste recurso; (4) acrescentar valor e fixar localmente os benefícios do uso do recurso, através de boas práticas de transformação e comercialização; e (5) introduzir os cogumelos silvestres na teia de iniciativas de desenvolvimento local no Douro-Duero, por exemplo nos domínios da valorização dos produtos tradicionais e da animação turística.

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